Planos de saúde: o impacto de regulações pouco restritivas

Juliana Kozoski
3/2/2025

A saúde suplementar no Brasil atravessa um momento crítico, exacerbado pela judicialização descontrolada, que tem comprometido a operação das gestoras de planos de saúde e afetado diretamente os consumidores. Este quadro tem se mostrado cada vez mais complexo e difícil de gerenciar, gerando um ciclo vicioso que impacta toda a cadeia do setor.

O aumento das demandas judiciais tem levado a uma sobrecarga no sistema, resultando em uma série de desafios tanto para os consumidores quanto para as operadoras de planos de saúde.

Assim, em um cenário de incertezas e insegurança jurídica, as empresas do setor têm visto suas capacidades de operar e oferecer um serviço de qualidade cada vez mais limitadas. Ao mesmo tempo, os custos dos planos aumentam, refletindo um impacto negativo na sustentabilidade do sistema e na experiência dos clientes.

Neste contexto, as regras ambíguas e a falta de clareza nas normativas para os planos de saúde têm gerado um crescimento alarmante de processos judiciais. Continue lendo!

Crescimento do número de processos

Nos últimos anos, o número de processos judiciais contra as operadoras de planos de saúde no Brasil cresceu de forma alarmante. De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2023, foram registrados 234.111 novos processos, representando um aumento de 60% em relação a 2020. Em 2024, de janeiro a outubro, o número já ultrapassou os 36.500 processos, uma média de 120 processos por dia. Atualmente, o Brasil possui mais de 330 mil processos envolvendo operadoras de planos de saúde.

A crescente judicialização é alimentada, em grande parte, pela regulação pouco restritiva que caracteriza o setor. Dessa forma, questões como negativa de cobertura, reajustes abusivos, cancelamento de contratos e recusa de serviços são algumas das principais causas desses processos. 

Rol taxativo e as consequências da regulação pouco restritiva

Um dos aspectos mais polêmicos da regulação de planos de saúde no Brasil envolve o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, que estabelece quais tratamentos e serviços devem ser obrigatoriamente cobertos pelas operadoras. Até 2022, esse rol era considerado taxativo, o que significava que os planos de saúde estavam obrigados a cobrir apenas os serviços e tratamentos ali listados. No entanto, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) alterou essa regra, permitindo uma "taxatividade mitigada", ou seja, os planos de saúde passaram a ser obrigados a cobrir tratamentos que não estavam listados no rol, caso haja uma indicação médica fundamentada.

Nesse sentido, a flexibilidade da regulação, estabelecida por essa mudança, é vista como uma resposta a demandas legítimas de acesso a tratamentos e inovações. No entanto, a regulação pouco restritiva trouxe consigo um aumento significativo da judicialização, uma vez que os consumidores passaram a buscar judicialmente coberturas que não estavam previstas originalmente. 

Impactos nos custos dos planos de saúde

Um estudo do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) revelou que os reajustes dos planos coletivos em 2023 superaram a inflação geral do país. O reajuste médio foi de 14,38%, enquanto a inflação do IPCA foi de 11,52%. 

Para 2025, as previsões indicam um aumento de 6,5%, o que, embora seja um cenário mais favorável, ainda assim traz desafios significativos para as operadoras e seus clientes.

Dessa forma, esse ambiente de incerteza jurídica e a escalada de processos contribuem para o aumento dos custos operacionais, o que é repassado para os clientes por meio de reajustes constantes. 

Afinal, essa falta de definições claras prejudica o setor como um todo, pois as operadoras ficam em uma posição difícil, sem saber exatamente até onde podem ir em relação ao que deve ser coberto. Como resultado, muitas delas optam por adotar uma postura mais conservadora, oferecendo coberturas limitadas para evitar riscos de litígios. 

Além disso, essa falta de segurança jurídica também torna o planejamento estratégico mais complexo, pois as operadoras não podem prever com precisão os custos que terão com processos judiciais.

A importância da sustentabilidade do setor

Para reverter o cenário de judicialização excessiva e os impactos negativos da regulação pouco restritiva, é importante que o Brasil implemente reformas no setor de saúde suplementar. 

Primeiramente, é necessário criar normas regulatórias mais claras e rígidas, que garantam um equilíbrio entre a cobertura obrigatória e a capacidade de operação das operadoras. Com regras mais restritivas e bem definidas, será possível reduzir a insegurança jurídica, evitando disputas legais desnecessárias.

Além disso, é importante investir em gestão de custos mais eficiente, implementando tecnologias que permitam um melhor controle e uma abordagem mais personalizada para os pacientes. 

Essas mudanças podem ajudar a reduzir os custos operacionais e aumentar a transparência nas relações entre operadoras e clientes. Afinal, a adoção de tecnologias também pode colaborar para a redução do número de processos, uma vez que melhora a comunicação entre consumidores e operadoras, tornando mais fácil resolver disputas antes que cheguem aos tribunais.

Em suma, a regulação pouco restritiva no setor de planos de saúde tem gerado um ambiente propício para o aumento da judicialização, com impactos diretos tanto para as operadoras quanto para os consumidores. Dessa forma, a falta de regras claras e a flexibilização de normas, como a mudança no rol taxativo, contribuem para um cenário de insegurança jurídica, que só agrava a situação.

Para garantir a sustentabilidade do setor, é fundamental implementar reformas regulatórias que promovam maior segurança jurídica, controle de custos e acessibilidade à saúde. 

Sem essas mudanças, será difícil manter o equilíbrio entre a sustentabilidade das operadoras e o acesso a planos de saúde de qualidade para os brasileiros.

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